A conta de energia elétrica dos brasileiros subiu 177% em 15 anos. A tarifa saltou de R$ 112 por megawatt hora (MWh), em 2010, para R$ 310 o MWh em 2024. Nesse período, o índice de inflação foi de 122%. Assim, em termos reais (descontada a inflação), a alta chega a 45%. A tarifa de energia elétrica dos brasileiros atendidos pelas distribuidoras aumentou 177% em 15 anos, saltando de R$ 112 por megawatt-hora (MWh), em 2010, para R$ 310 o MWh, em 2024. Nesse mesmo período, o índice de inflação avançou 122%. Ou seja, a tarifa teve um aumento real (acima da inflação) de 45% no período. Detalhe: o valor inclui o preço da energia, acrescido das bandeiras tarifárias vigentes a cada ano, sem os encargos e o custo da distribuição e da transmissão, que encarecem ainda mais o preço final para o consumidor. Esse quadro pode mudar depois da Medida Provisória n.º 1.300, editada pelo governo federal, que reforma o setor elétrico brasileiro e estabelece a abertura do mercado livre para todos os consumidores a partir de dezembro de 2027. Isso significa que a partir dessa data qualquer cidadão poderá escolher de onde comprar sua energia elétrica, a exemplo do que ocorre hoje com as grandes empresas. Para esses clientes, a conta é bem mais baixa porque os contratos são de longo prazo e embutem o efeito da concorrência do mercado. Em comparação com o aumento de 177% da tarifa de energia para os consumidores do mercado cativo (das distribuidoras), o preço médio do mercado livre aumentou 44%, bem abaixo do índice de inflação. O valor subiu de R$ 102 o MWh, em 2010, para R$ 147, em 2024, segundo levantamento da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel). A explicação para a tarifa elétrica no mercado regulado ser mais cara se deve a vários motivos. Entre eles, a indexação de longo prazo, reservas de mer Preço médio da energia elétrica no mercado livre tem alta de 44% desde 2010, mostra estudo cado que obrigam a contratação de energia de determinadas fontes, decisões políticas sobre o custo da energia ou expansão da geração, mas também riscos indevidamente transferidos ao consumidor, como o risco hidrológico. “Contratar energia elétrica indexada à inflação por 30 anos é um fardo para o consumidor, sobretudo num país que têm inflação nos patamares do Brasil”, explica o presidente executivo da Abraceel, Rodrigo Ferreira. Um exemplo, segundo ele, está na energia contratada das hidrelétricas estruturantes do Rio Madeira, cujos valores resultantes dos leilões foram baixos, mas, com a atualização inflacionária no período, essas tarifas já custam mais que o preço praticado no mercado livre de energia. “Esse modelo de contratação de longo prazo, suportado pelas distribuidoras em nome dos consumidores, foi importante em determinado momento do País, mas atualmente não é mais eficiente e muito menos necessário, e deixa uma herança maldita para os consumidores.” DIFERENÇA. Outro ponto importante é a energia de Itaipu, Angra 1 e 2 e energia de reserva, cujo preço é elevado. Todo esse montante de eletricidade é vendido para as distribuidoras e repassado para os consumidores cativos, diz o professor da UFRJ Nivalde de Castro, coordenador-geral do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel). Se comparar com o preço final da conta de luz, que inclui encargos e o custo de transmissão e distribuição, o preço no mercado livre pode ser até 35% menor que o do mercado cativo, das distribuidoras. • A abertura do mercado de energia elétrica é apontada por especialistas como uma alternativa para conter a alta de preços na tarifa dos consumidores atendidos pelas distribuidoras. O pesquisador da Fundação Getulio Vargas Energia, Paulo Cunha, defende a abertura do mercado livre, com todos os cuidados necessários. “Quando você liberaliza o mercado, você traz a possibilidade de competição. É um elemento importante porque é a possibilidade de você trazer eficiência econômica. A abertura do mercado vai dar para os consumidores a possibilidade de escolha. Isso, na minha visão, é positivo.” Ele alerta, no entanto, que não são operações triviais. Tanto que a medida provisória do governo – que estabelece a abertura do mercado livre para todos os consumidores – cria um elemento importante nesse processo de abertura, que é o Supridor de Última Instância, o SUI. O diretor-presidente da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), Alexei Vivan, afirma que a abertura do mercado de energia elétrica vem sendo aguardada há tempos, mas ele também alerta que é preciso tomar alguns cuidados importantes. Um deles é a garantia de adimplência desses novos consumidores livres de pequeno porte, com regras para a comercialização varejista. Além disso, a regulamentação tem de ser minuciosa em relação à figura do SUI. É ele que assumirá e representará os consumidores em caso de quebra da comercializadora varejista. Por fim, diz o executivo, é preciso garantir a sustentabilidade da concessionária de distribuição. “Ela é o tripé de sustentação de todo o setor elétrico e estará ameaçada se os impactos não forem bem mensurados e a migração dos consumidores para o mercado livre resultar em aumento da tarifa dos consumidores que permanecerem cativos, o que poderá causar inadimplência na distribuição”, diz Vivan. Segundo ele, é essencial que os consumidores que optarem por se tornar livres escolham comercializadoras varejistas sérias, com reputação e solidez financeira. SUBSÍDIOS. De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), até este mês, os subsídios do setor elétrico somam mais de R$ 16 bilhões, que representam, em média, 14,88% da tarifa dos consumidores residenciais. Desse valor, R$ 5,7 bilhões se referem ao incentivo dado à geração distribuída, aquela produzida pelos próprios consumidores, como a energia solar. Outros R$ 5,4 bilhões vão para fontes incentivadas (descontos concedidos para estimular projetos de energia renovável). O restante vai para subsídios à energia da Região Norte e para tarifa social, entre outros. “Muitos subsídios e encargos são compulsoriamente imputados às tarifas do mercado regulado. Essa é a causa principal para a conta ser tão alta”, diz o professor da UFRJ Nivalde de Castro.